Na quarta-feira, 24/07 , o presidente israelense Netanyahu fez um discurso no Congresso dos Estados Unidos em que foi aplaudido 58 vezes de pé por republicanos e democratas, enquanto defendia um dos maiores genocídios da história, o qual Israel sob seu comando está fazendo contra a população palestina na Faixa de Gaza.
Lorenzo Maria Pacini – consultor em Análise Estratégica, Inteligência e Relações Internacionais, e professor da UniDolomiti de Belluno, Itália – chamou de o discurso “que ficará registrado na história do palhaço mais perigoso do mundo”.
A Aliança Abraâmica: realidade ou obra de ficção?
Na ausência da liderança política – envolvida em uma crise social sem precedentes de escândalos de pedofilia, velhos com Alzheimer apertando botões aleatórios em salas de guerra e palhaços sob efeito de medicamentos psiquiátricos atacando bancos -, o ‘estalajadeiro’ do Oriente Médio aproveitou a oportunidade para viajar a Washington e esclarecer certos aspectos programáticos do futuro do Ocidente coletivo.
Aqui estão alguns destaques de seu discurso maluco, com o qual ele orwellianamente virou a realidade de cabeça para baixo, espalhou notícias falsas, manipulou seus ouvintes e legitimou um genocídio que acontece enquanto o resto do mundo pensa em tirar férias, enquanto escrevem nas redes sociais para lavarem sua consciência, “Todos os olhos em Rafah”.
– “A guerra em Gaza tem uma das menores proporções de combatentes para não combatentes na história da guerra urbana”;
– “Nenhum civil palestino inocente foi morto pelas IDF em Rafah”;
– “O Irã está por trás de todo o terrorismo, de toda a agitação, de todo o caos e de toda a matança sem fim. E isso não deveria ser nenhuma surpresa”;
– “Para o Irã, Israel é o primeiro, a América é o segundo. Quando Israel luta contra o Hamas, estamos lutando contra o Irã. Quando lutamos contra o Hezbollah, estamos lutando contra o Irã. Quando lutamos contra os Houthis, estamos lutando contra o Irã. E quando lutamos contra o Irã, estamos lutando contra o terrorismo radical”;
– “Não estamos apenas protegendo Israel, estamos protegendo os Estados Unidos. Nossos inimigos são seus inimigos. Nossa luta é sua luta. Nossa vitória é sua vitória”;
– Netanyahu então propôs uma Aliança Abraâmica, composta por Israel, os EUA e os países árabes dependentes de ambos.
– Ele recebeu um total de 58 ovações e aplausos de pé em seu discurso de 60 minutos (nem era um show de Taylor Swift!).
Então, para recapitular:
– O genocídio dos palestinos não existe;
– Se há um genocídio bom, é o israelense;
– A Palestina se chama Israel e se você pensa o contrário você é um idiota;
– Israel é uma vítima, desafortunadamente encontrou-se diante do lar de pessoas que moram há milhares de anos nesse local e que estão exigindo suas terras de volta;
– O único palestino bom é um palestino morto;
– O Irã (o único país do mundo que lutou contra o imperialismo do Grande Satã (Israel+EUA+Reino Unido+Arábia Saudita) é inteiramente culpado por ser xiita (e também por ter erradicado o terrorismo islâmico wahabita e salafista do Oriente Médio e por ter contido o expansionismo imperialista);
– Se você pensa o contrário, talvez você também merece um tiro.
A Aliança Abraâmica
No delírio geral de suas palavras, Netanyahu apresentou a proposta estratégica de uma aliança, militar, política e econômica, chamada de ‘Aliança Abraâmica’.
Se os EUA tivessem tentado formar essa aliança há 10 anos, poderíamos dizer que a Arábia Saudita, os Emirados Árabes Unidos, o Bahrein, a Jordânia e o Egito provavelmente teriam se juntado. Com a guerra síria em andamento, os medos sobre o programa nuclear e o sentimento anti-iraniano em ebulição, as nações árabes sentiram que tinham algo a provar.
No entanto, no Oriente Médio do ano de 2024, com o Irã como uma força emergente que impôs equações de hard power aos seus vizinhos, e após o acordo de paz entre o Irã e a Arábia Saudita, acho que tal aliança não é viável. Na melhor das hipóteses, o Reino da Jordânia e o Bahrein se juntariam a tal aliança.
A Arábia Saudita está abertamente interessada em laços mais próximos com o Irã, os Emirados Árabes Unidos seguem principalmente a política saudita e são fortemente dependentes de importações iranianas, enquanto o Egito tem um histórico de rejeitar alianças e tem problemas maiores do que o Irã. Nenhum desses países ficará entusiasmado com a perspectiva de uma aliança anti-Irã em um momento em que o Irã está rapidamente emergindo como uma potência geopolítica preeminente no Oriente Médio.
A Jordânia, por sua dependência da OTAN e dos EUA, é a mais provável a ser a favor. Foi a única nação árabe a abrir seu espaço aéreo para a Força Aérea Israelense quando o Irã lançou seus ataques de mísseis [e drones] contra Israel em abril deste ano.
O Bahrein, que hospeda a Frota dos EUA no Golfo Pérsico, embora possa estar interessado em se juntar a ela, também expressou abertamente seu interesse em restabelecer laços diplomáticos com a República Islâmica do Irã.
Em resumo: a ‘Aliança Abraâmica’ provavelmente acabará sendo uma casca oca do que poderia ter sido. Será uma aliança vazia e superficial, consistindo principalmente dos EUA e Israel, semelhante à Operação Prosperity Guardian, que é amplamente considerada um fracasso.
Então, em tudo isso, resta um último ponto fundamental a considerar: enquanto Netanyahu e seus seguidores tagarelam sobre transformar o conflito israelense-palestino em uma guerra global com base religiosa (no perfeito estilo escatológico neocon), eles talvez se esqueçam de que o resto do mundo – “o resto”, como os americanos costumavam dizer – está virando uma nova página e não ficará parado assistindo. Rússia e China já concluíram a colocação dos pilares de um mundo multipolar… no qual a guerra não será mais travada como antes.
Publicado em Strategic-Culture.