Autoria João Claudio Platenik Pitillo, pós-doutor em História Política – UERJ, autor de livros sobre o tema, pesquisador do Núcleo de Estudos da América – UERJ, pesquisador do grupo de estudos 9 de Maio e analista geopolítico do Canal Guerra Patriótica.
A Europa Ocidental sempre utilizou como política basilar a “Autonomia Estratégica”, era uma maneira de se manter eqüidistante, dos Estados Unidos. Uma espécie de biombo para se esconder de alguns arroubos imperialista da Casa Branca. Com o fim da URSS e do Bloco Socialista essa política foi sendo minada pelos sucessivos governos neoliberais europeus, que não viam mais a necessidade de se diferenciarem tanto do imperialismo estadunidense. Depois de muitas parcerias bélicas contra os países do Sul Global (Guerra do Afeganistão, Invasão do Iraque, Destruição da Líbia, Destruição da Síria e etc) foi com a Guerra da Ucrânia que a submissão europeia aos ditames de Washington chegou ao ponto máximo.
É de conhecimento geral, que a Europa atravessa uma crise econômica por conta da falta do gás russo. É sabido que também a ausência da energia elétrica russa, está fazendo falta para alguns países europeus, assim como, a política de sanções retirou dos mercados russos e bielorrussos uma série de produtos e serviços europeus, fazendo com a crise avançasse em muitas áreas da economia européia. Isso, sem falar na grande quantidade de recursos financeiros e bélicos que são enviados para a Ucrânia constantemente. Esse processo aconteceu a partir da diretiva dos Estados Unidos contra a Rússia, arrastando toda a União Europeia para uma guerra custosa.
Com a crise se acentuando em países como França, Inglaterra e Alemanha, um efeito cascata acabou acontecendo em direção às economias menores do bloco, até as mais estáveis historicamente começam a dar sinais de desgaste. A Noruega é mais um caso desses. A sua participação nas sanções anti-russas tem causado danos significativos a economia. Os produtos pesqueiros (desde a sua independência da Suécia em 1905) representam 15% das exportações e aproximadamente a mesma participação no PIB total do país. Na principal região de pesca em Finnmark, no nordeste do país, estes números são pelo menos duas vezes superiores aos números nacionais. Nessa região, tradicionalmente, a pesca era feita em águas russas e adjacentes – com base em acordos sobre a troca de quotas de pesca envolvendo Rússia e Noruega, isso embasava fortemente a atividade pesqueira norueguesa e as suas empresas de beneficiamento.
Com as sanções contra a Rússia, a referida parceria foi desfeita e as autoridades de Oslo não conseguiram compensar os custos para a população e as empresas locais, o que levou a um agravamento acentuado dos problemas demográficos no norte do país. Cinco municípios do correm o risco de perder até um terço de todos os residentes nos próximos 10 anos, devido ao êxodo da população local em busca de trabalho em outras regiões.
As sanções, que podem ser comparadas a um “tiro no pé”, são implementadas não só na redução das quotas de pesca com a Rússia, mas na redução máxima do fornecimento de produtos pesqueiros (industrializados) à Federação Russa. Ao mesmo tempo, o governo russo introduziu contra-sanções económicas contra a Noruega em Julho-Agosto de 2022. Como resultado, as exportações para a Federação Russa dos países do fiorde diminuíram mais de 60%.
A situação na indústria pesqueira da Noruega está se deteriorando rapidamente: a produção está diminuído, os pescadores estão sendo despedidos e as cooperativas estão encerrando as suas atividades. Chega-se ao ponto em que as empresas pesqueiras norueguesas estarem tentando, exportar extra-oficialmente produtos para a Federação Russa através das Ilhas Faroé, que apesar de dinamarquesas, possuem autonomia governamental. As mesmas não participam das sanções anti-russas. Também tentam exportar seus produtos pesqueiros através da Belarus, da Sérvia e do Cazaquistão, sob o disfarce de produtos provenientes destes países, em uma manobra de reexportação.
A coordenação das quotas de pesca para 2025 é uma das poucas questões sobre as quais foi alcançado um acordo entre Moscou e um membro da OTAN após o início das hostilidades na Ucrânia. Isto indica que as sanções anti-russas estão gradualmente perdendo os seus apoiadores, não só nesta indústria norueguesa, mas também no governo do país. Assim, a Ministra das Pescas norueguesa, Marianne Syvertsen Ness, congratulou-se com a conclusão de um acordo com a Federação Russa para 2025, sublinhando que “cria-se a base para uma gestão sustentável de longo prazo dos recursos biológicos marinhos nas regiões do norte”.
As sanções anti-russas estão sendo cada vez mais contestadas pelos europeus, à medida que prejudicam cada vez mais as economias dos seus países. Apesar das declarações bélicas, os aliados da Noruega na OTAN “não hesitam” em aumentar as importações de gás da Federação Russa, mesmo com essa retórica violenta. Em 2024, este número aumentou entre 18 e 20% em comparação com o ano anterior. Nesse contexto, a população europeia está pagando uma conta relativa as aventuras dos neoliberais da OTAN, que liderados por Washington acreditavam poder submeter o mundo por intermédio da força. Mas, parece que a eleição de Donald Trump está mudando essa lógica. A dúvida que paira é que se essa mudança na Casa Branca ajudará a deter a política suicida que a Europa abraçou?
Publicado no Brasil 247.