Autoria Mohamed Sweidan, pesquisador de relações internacionais e estratégicos, com foco em Rússia, Turquia, segurança energética e geopolítica, analista em The Cradle e outras mídias.
À medida que a guerra se alarga, os ativos dos EUA tornam-se alvos fáceis
Durante uma coletiva de imprensa na Casa Branca em 31 de julho, o porta-voz do Conselho de Segurança Nacional, John Kirby, ressaltou o comprometimento dos EUA em manter a prontidão para proteger seus interesses de segurança na Ásia Ocidental.
“Temos e manteremos um nível de prontidão para preservar nossos interesses de segurança nacional na região. Não é como se fizéssemos vista grossa para o que o Irã é capaz de fazer e mostrou sua capacidade na região”, disse Kirby.
Seus comentários foram feitos em meio a elevadas tensões regionais, as mais altas desde 7 de outubro. Proteger os interesses de Washington no Levante e no Golfo Pérsico é uma das principais prioridades do governo Biden, especialmente dadas as perigosas provocações recentes de Tel Aviv, incluindo os ataques e assassinatos em Beirute, Teerã e Hodeidah – em território de países-chave dentro do Eixo da Resistência, o que pode se transformar em um grande conflito ameaçando os próprios interesses dos EUA.
Militarização dos EUA na Ásia Ocidental
Quase um mês após o início da guerra em Gaza, o Pentágono delineou seus principais objetivos na Ásia Ocidental. Eles incluem proteger as forças e cidadãos dos EUA, garantir o fluxo contínuo de assistência de segurança crítica para o Estado de ocupação israelense, coordenação com as autoridades de ocupação para garantir a libertação de prisioneiros mantidos pelo Hamas, incluindo cidadãos americanos, e reforçar a presença militar dos EUA para impedir que qualquer ator estatal ou não estatal escale ainda mais a crise. Fica claro, que o foco de Washington se estende muito além de Gaza.
Em outubro passado, quando a guerra em Gaza irrompeu após a Operação Al-Aqsa Flood do Hamas, mais de 45.000 tropas dos EUA estavam estacionadas na Ásia Ocidental, espalhadas por bases militares dos EUA em cerca de 12 países. Esse número não inclui as frotas navais permanentemente estacionadas nas muitas hidrovias da região.
Além disso, os EUA enviam intermitentemente milhares de tropas para responder a crises e tensões crescentes, como evidenciado pela realocação de quase 1.200 militares e milhares de outros homens a bordo do porta-aviões e pelo envio da unidade expedicionária navais com quase 2.000 fuzileiros desde o início da guerra em Gaza.
Em resposta à escalada da situação, particularmente após os assassinatos seletivos do comandante sênior do Hezbollah, Fuad Shukr, e do chefe do Politburo do Hamas, Ismail Haniyeh, em Beirute e Teerã, respectivamente, o Departamento de Defesa dos EUA anunciou ajustes estratégicos em sua postura militar na região.
Esses ajustes têm dois objetivos principais: aumentar a proteção das forças dos EUA e dar suporte à defesa de Israel. Para manter uma presença robusta, o Secretário de Defesa Lloyd Austin ordenou que o grupo do porta-aviões de ataque USS Abraham Lincoln substituísse o USS Theodore Roosevelt na área sob o Comando Central do Pentágono.
Austin também enviou cruzadores e contratorpedeiros adicionais capazes de defesa contra mísseis balísticos para as regiões do Comando Europeu dos EUA e do Comando Central dos EUA. Além disso, o Pentágono está aumentando sua prontidão para enviar defesas adicionais contra mísseis balísticos terra-terra e ordenou a remessa de um esquadrão extra de caças para a Ásia Ocidental.
Esses ajustes aumentam as amplas capacidades que os militares dos EUA já mantêm na região, incluindo o USS Wasp Ready Amphibious Group/Marine Expeditionary Unit operando no Mediterrâneo Oriental.
Império econômico dos EUA na Ásia Ocidental
Além do significativo aumento militar dos EUA na Ásia Ocidental, as empresas civis dos EUA também desempenham um papel importante na região, principalmente em setores críticos envolvendo petróleo e gás, tecnologia e telecomunicações.
O investimento estrangeiro direto (IED) na Ásia Ocidental teve um crescimento notável em 2023, com empresas investindo em 1.848 projetos avaliados em US$ 88,3 bilhões. Como resultado, a Ásia Ocidental foi classificada em termos de interesse do investidor como a quarta região mais atraente para IED em 2024.
Os EUA foram a principal fonte de IED para a Ásia Ocidental em 2023, com empresas americanas anunciando 362 projetos avaliados em US$ 36 bilhões. Isso representou um aumento notável de capital, com mais que o dobro dos anos anteriores.
Essas empresas estão fortemente concentradas nos estados do Golfo Pérsico, particularmente Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Catar e Omã – assim como em Israel. O estado de ocupação é um destino particularmente acessível para o investimento dos EUA na região, com o IED (em ações) dos EUA somente em Israel atingindo US$ 42,5 bilhões em 2022. Esse investimento é focado principalmente em manufatura, serviços de informação e serviços profissionais, técnico-científicos.
Fechamento do Estreito de Ormuz
A possibilidade do Irã fechar o Estreito de Ormuz é uma preocupação recorrente sempre que as tensões com a República Islâmica aumentam. Este estreito é uma rota de navegação crucial, lidando com quase 30% do comércio mundial de petróleo.
Conectando o Golfo Pérsico ao Oceano Índico, do Irã ao norte, os Emirados Árabes Unidos e Omã ao sul. O perigo desse corredor ser fechado durante tempos de tensão é por sua profundidade ser rasa, o que deixa os navios vulneráveis a minas. Sua proximidade com o continente iraniano também torna os navios suscetíveis a ataques de mísseis costeiros ou interceptação por barcos de patrulha e helicópteros.
O fechamento do estreito teria efeitos imediatos nos preços globais de energia. No primeiro trimestre de 2024, as petroleiras enviaram pelo estreito quase 15,5 milhões de barris por dia de petróleo bruto e condensado da Arábia Saudita, Iraque, Kuwait, Emirados Árabes Unidos e Irã. O estreito também é um corredor crítico de gás natural liquefeito (GNL), com mais de um quinto do suprimento mundial passando pelo golfo durante o mesmo período, principalmente vindo do Catar.
Os americanos pagarão o preço
Conforme observado anteriormente no The Cradle, um estudo do Banco Mundial indicou que qualquer tensão na região impactaria diretamente os preços de energia, com a taxa de aumento variando de acordo com o nível de tensão. Essa questão é particularmente significativa agora, pois as pesquisas dos EUA mostram que a maioria dos eleitores priorizam a economia doméstica.
Uma pesquisa Pew de fevereiro descobriu que 73% dos eleitores consideram o fortalecimento da economia a prioridade máxima. Consequentemente, o Irã tem o potencial de influenciar o sentimento do eleitor americano indiretamente, afetando os preços de energia por meio de ações envolvendo o estratégico Estreito de Ormuz.
A probabilidade de uma guerra regional está se tornando cada vez mais tangível devido às persistentes políticas agressivas do Primeiro-Ministro israelense, Benjamin Netanyahu, em Gaza e por toda a região. Este conflito em potencial multifrontal pode atingir níveis sem precedentes, especialmente considerando a percepção do Irã de que sua própria existência como uma República Islâmica está em jogo.
Em tal cenário, Teerã e outros membros do Eixo da Resistência provavelmente empregarão todos os recursos e estratégias disponíveis para defender seus interesses coletivos. E se as forças ou instalações militares dos EUA se envolverem diretamente, os interesses dos EUA – tanto militares quanto econômicos – estarão no centro do confronto.
Enviar mais tropas e ativos dos EUA para a região em um momento tão crítico apenas amplia os alvos americanos para o Eixo.
Publicado em The Cradle.